Sáb. Abr 19th, 2025

Nyusi mora no ‘epicentro do terror’: Cabo Delgado é guerra ou encenação?
John Kanumubo

Enquanto o povo é massacrado, o silêncio político e mediático ainda revela a face oculta da guerra pelos recursos. Pergunto-me, com inquietação genuína: por que razão um antigo Chefe de Estado escolheu fixar residência numa zona (embora não declarada oficialmente) de conflito armado? Será ironia? Será desafio? Ou será simplesmente a maior das confissões nas entrelinhas de que a tão falada guerra em Cabo Delgado é um teatro, uma farsa encenada com sangue real e lágrimas autênticas de um povo abandonado? Ou porque como se diz retornou à casa a fim de sentir de perto? Ou preservar e monitorar de perto o bem dos seus interesses e ligações naturais?

Essas perguntas incomodam a minha mente como um trovão no meio da noite, sem resposta. Não há lógica militar, prudência civil ou inteligência estratégica que justifique tal decisão, a menos que estejamos diante de uma realidade encoberta: não há guerra nenhuma.

A força dessas perguntas reside na sua simplicidade. Onde há guerra verdadeira, ninguém se instala. Onde há perigo real, os líderes fogem. Mas em Cabo Delgado — outrora anunciado como o epicentro do terrorismo islâmico, do jihadismo brutal, de decapitações e ataques bárbaros — o ex-Presidente da República de Moçambique, Filipe Nyusi, encontra repouso, segurança e estabilidade. Que tipo de guerra é essa, que pousa estrategicamente o território onde reside o mais alto dirigente da era da violência em Cabo Delgado?

Como natural de Mocímboa da Praia, falo tem temor, mas escrevo. Cresci no meio do som de metralhadoras. Vi amigos a morrer. Vi professores a fugir. Vi colegas de escola a serem executados. Vi jovens a serem recrutados pelas forças inimigas e pelos grupos armados que o Estado chama de terroristas.

Não sou analista político. Sou sobrevivente e cidadão. E mesmo longe da minha terra natal, o conflito nunca me saiu do coração. Fui forçado a fugir, a deixar a minha família. Mas levo em mim a missão de continuar a ser a voz dos que ficaram e dos que perderam a voz. O povo está farto de mentiras. Farto de ser carne de canhão num jogo de interesses que não compreende. Nyusi fixar residência em Cabo Delgado, sem nenhuma ameaça à sua integridade física, é um insulto à nossa dor.

Não há desenvolvimento onde só sangue do povo justifica operações estrangeiras, exploração desenfreada de recursos naturais e agendas políticas ocultas. A cada ataque televisivo, uma nova concessão é assinada com uma multinacional. Gás, rubis, madeira, diamantes, ouro — todos fluem. O povo, apenas sangra.

O antigo presidente vive na província tida como epicentro do conflito. Mas curiosamente, onde ele reside, não há ataques. Os insurgentes evitam a sua zona. Isso reabre a pergunta essencial: afinal, onde está a guerra em Cabo Delgado?

Ao descer ao Palácio da Ponta Vermelha, Nyusi aparece com um segurança, nunca vi mais ninguém. O Estado nada esclarece. O novo governo finge normalidade. Se nem o ex-presidente confia na proteção estatal, quem protege o povo de Mocímboa, Mbau, Awasse, Nangade, Chitunda, Macomia?

A guerra tornou-se um negócio. O discurso oficial oculta, nega e manipula. Jornalistas que tentaram denunciar desapareceram. O antigo porta-voz das FDS, Cristóvão Chume, agora Ministro da Defesa, ainda não ofereceu explicações concretas. Nyusi, com tom triunfalista, declarou o fim do terrorismo — para, logo depois, instalar-se no “centro” do conflito.

Missão cumprida. Mas para quem?
O nosso povo em Mocímboa, Quissanga, Meluco, etc., ainda morre. As escolas continuam fechadas. As crianças são usadas como escudos humanos e mulheres continuam a ser violadas como troféus de guerra. A paz é uma miragem.

O mundo silencia. As organizações internacionais assistem. A ONU fala pouco. A União Africana diverge. A SADC observa. Os Estados Unidos e Reino Unido seguem com interesses próprios. França financia. China ganha contratos. Rússia fornece armas.

Enquanto isso, em Palma, insurgentes circulam à luz do dia. Em Nangade, atacam sem resistência. Em Muidumbe, transformam igrejas em base militar. Em Quissanga, queimam escolas e clínicas. Em Macomia, fazem da população refém.

Tudo acontece à vista de todos — outrora órgãos de soberania, agora cúmplices silenciosos. E Nyusi, no “centro”, repousa em tranquilidade. Quem denuncia, perseguido. Quem se cala, promovido. França assina. A União Europeia financia. A Frelimo concorda.

Kagame executa. E o povo morre. As FDS foram neutralizadas. Tropas estrangeiras mandam. Ruandeses circulam com autoridade total. Chamam-se “ajuda internacional”, mas mantêm comandos e territórios próprios. A guerra não é entre terroristas e forças estatais, é entre nós e os filhos a morrer. Cabo Delgado tornou-se laboratório de intervenção estrangeira.

Não estamos perante uma ocupação sócio-militar. Estamos perante o jogo do fim de um povo. É a colonização, não como outrora, mas com novas roupagens. O terror está ao serviço do capital.

Cada ataque tem promessas de ajuda. Mais contratos com petrolíferas, mineradoras, construtoras. O povo enterra os seus mortos e foge, esculpido e faminto. E Maputo continua calmo, distante da realidade. Se Maputo fosse Palma, cada um da cidade seria refugiado.

A verdade nunca teve lugar desde 1975. A guerra é um negócio. E enquanto ela durar, haverá dividendos. O ex-presidente sabe. Por isso, fixou-se onde se dizia ser o inferno. Palavra encenada. Povo encenado. Vidas reais.

A história dirá quem foram os carniceiros. E quem foram os mártires. Evidência

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