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Vacinação, estatísticas e contradições: afinal, quantos somos em Moçambique?

O Ministério da Saúde (MISAU) lançou recentemente uma ambiciosa campanha nacional para vacinar 18,2 milhões de crianças com menos de 10 anos. A notícia, divulgada pela STV, causou alarme — não apenas pelo volume da população infantil envolvida, mas pelas inconsistências que revela nas estatísticas oficiais sobre a população moçambicana.

Segundo o Instituto Nacional de Estatística (INE), a população total de Moçambique em 2025 é de cerca de 34 milhões de pessoas. No entanto, os números divulgados por várias instituições do próprio Estado e organismos internacionais não batem certo:

A Comissão Nacional de Eleições (CNE) afirma que há 17 milhões de eleitores registados no país.

O MISAU estima 18,2 milhões de crianças com menos de 10 anos, que estão agora no alvo da campanha de vacinação.

O UNICEF indica que existem 13 milhões de crianças em situação de pobreza, num total de mais de 16 milhões de crianças.

O próprio INE aponta que existem 14 milhões de pessoas com menos de 15 anos.


Fazendo contas simples: 17 milhões de eleitores adultos somados a 18 milhões de crianças resultam em 35 milhões de pessoas, ou seja, um milhão a mais do que a população total oficial. E onde estão os adolescentes e jovens entre os 10 e os 18 anos?

Esta não é uma simples questão de discrepância estatística. Trata-se de um sintoma profundo de desordem institucional na produção, validação e utilização de dados demográficos em Moçambique. E os impactos disso são reais e graves:

Recursos públicos podem estar a ser mal alocados, por exemplo em campanhas de saúde ou educação.

Políticas públicas são formuladas com base em números inconsistentes, correndo o risco de fracassarem na implementação.

Intervenções sociais perdem eficácia, por falta de foco nos grupos populacionais mais necessitados.

A planificação nacional transforma-se num exercício de ficção, com previsões e orçamentos que não reflectem a realidade do país.


Quando os dados mudam consoante o objectivo — seja ele vacinação, eleições, captação de fundos ou outra agenda — corre-se o risco de transformar as estatísticas num instrumento político, em vez de uma ferramenta de verdade e desenvolvimento.

Para reverter esta situação, Moçambique precisa urgentemente de três medidas fundamentais:

1. Padronização nas categorias etárias e metodologias estatísticas — todos os ministérios devem utilizar os mesmos critérios.

2. Transparência metodológica — os dados devem ser acompanhados por explicações claras sobre como foram recolhidos e calculados.

3. Auditoria independente dos dados populacionais — para garantir fiabilidade, consistência e confiança pública.

Sem dados fiáveis, não há políticas justas, nem desenvolvimento sustentável possível. Augusto dos Santos Pelembe

 Vacinação, estatísticas e contradições: afinal, quantos somos em Moçambique?

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