Qui. Abr 24th, 2025

A nova lei do governo Moçambicano para sufocar a sociedade civil moçambicana

O espaço cívico e as liberdades fundamentais em Moçambique estão sob grave ameaça. O Governo prepara-se para aprovar, com o respaldo da maioria parlamentar, um instrumento legal que poderá representar um dos maiores retrocessos democráticos desde a aprovação da atual Constituição da República.

Sob o pretexto de prevenir o branqueamento de capitais e combater o financiamento ao terrorismo, a proposta legislativa visa impor um controlo apertado sobre as Organizações da Sociedade Civil (OSC), tanto nacionais quanto estrangeiras.

Entre outras medidas, o documento estabelece que o Estado poderá determinar o conteúdo dos estatutos das organizações, a estrutura de funcionamento dos seus órgãos sociais, os direitos dos membros, o limite de mandatos e os mecanismos de prestação de contas. O não cumprimento dessas normas poderá culminar no encerramento da organização por decisão do Executivo.

À DW, o jurista e membro da sociedade civil, Tomás Vieira Mário, considerou que a proposta não apenas regula, mas submete as organizações ao estatuto de departamentos governamentais.

“É inconstitucional. A Constituição da República é muito clara, e os direitos fundamentais [só podem ser] limitados pela própria Constituição, e não de forma arbitrária ou por vontade do Governo.”

A proposta exige ainda que todas as organizações submetam, anualmente, relatórios de atividades detalhados, incluindo informações financeiras, sob pena de sanções. O Governo fundamenta esta exigência na alegação de suspeitas de branqueamento de capitais por parte de algumas ONGs.

Essa narrativa é contestada por Edson Cortez, diretor executivo do Centro de Integridade Pública, que questiona a prioridade dada à fiscalização das OSC em detrimento de outros setores mais críticos.

“Para mim, isto é um contrassenso e só mostra a vontade que o Estado tem de tentar calar as organizações da sociedade civil.”


Moçambique foi incluído nalista cinzenta do Grupo de Ação Financeira Internacional (GAFI) devido a atividades económicas ligadas ao branqueamento de capitais e ao financiamento ao terrorismo. O Governo tem indicado que as ONGs representam um fator de risco para a permanência do país nessa lista.

Contudo, o economista Gabriel Manguele contesta essa posição, lembrando um estudo encomendado pelo próprio Executivo que concluiu que essas organizações não estão vulneráveis a crimes financeiros.

“Moçambique não continua na lista cinzenta do GAFI por causa desta questão, mas sim porque temos dificuldades em criminalizar e nunca houve uma agenda séria para combater o crime de branqueamento de capitais.”

Tomás Vieira Mário também tece críticas à técnica legislativa usada na formulação do documento:

“Não se sabe se aquilo é lei, política; não é sistemático, não é consistente. Parece que foi uma cópia de muitas leis.”

O jurista acrescenta ainda que o texto trata as associações como grupos de indivíduos de conduta duvidosa, que podem representar uma ameaça à segurança do Estado.

Com a ascensão de um novo Executivo num contexto político instável, a incerteza persiste: o Governo liderado pela FRELIMO há cinco décadas avançará com a aprovação deste controverso documento?

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