Dom. Jun 1st, 2025

Tensão: União africana exige eleições, mas líderes do Sahel defendem soberania militar

A tensão diplomática entre a União Africana (UA) e a Aliança dos Estados do Sahel (AES), composta por Mali, Burkina Faso e Níger, intensificou-se nos últimos dias, após a UA exigir o restabelecimento da ordem constitucional e a transferência do poder para civis através de eleições democráticas. A resposta a esta posição tem gerado uma onda de críticas por parte de sectores pan-africanistas que defendem uma abordagem soberana e adaptada à realidade política do continente.

A exigência da UA surge num momento em que os referidos países, liderados por governos militares considerados “patrióticos e revolucionários” pelos seus apoiantes, implementam mudanças estruturais profundas em nome da segurança, soberania e descolonização efectiva. Os militares no poder alegam estar a proteger os seus países do colapso imposto por anos de má governação civil, muitas vezes associada à corrupção e à subserviência a interesses estrangeiros.

“Entregar o poder novamente aos políticos seria abrir caminho para o regresso da pilhagem dos nossos recursos pelos neocolonialistas. Seria perpetuar regimes vassalos que só servem interesses externos. A África deve construir a sua própria democracia, de forma autónoma e livre de imposições externas”, afirma um analista político sediado em Ouagadougou, em declarações sob anonimato.

A crítica vai mais longe: para muitos defensores dos actuais regimes do Sahel, a União Africana deixou de representar os interesses autênticos do continente. Apontam para o financiamento externo da organização como evidência da sua dependência do Ocidente, nomeadamente dos Estados Unidos e da União Europeia. “É vergonhoso que uma organização continental africana seja manietada por europeus brancos e norte-americanos. Não temos liberdade de decidir o nosso destino?”, questiona um jovem activista do Níger.

A referência ao caso de Muammar Gaddafi, deposto e morto com o apoio da NATO em 2011, surge como símbolo do que muitos africanos veem como a destruição de um projecto soberano africano. “Não podemos permitir que o exemplo líbio se repita. O povo do Sahel está satisfeito com os seus líderes actuais, e os resultados falam por si. Segurança, ordem e orgulho nacional foram restaurados”, defendem os apoiantes da AES, evocando também o legado de Jerry Rawlings no Gana, que conduziu o país por vias não convencionais para alcançar estabilidade e progresso.

Perante a crescente pressão da UA, vozes influentes na região começam a sugerir abertamente que os países da Aliança do Sahel considerem abandonar a organização pan-africana. “Se a União Africana continuar a ser uma extensão dos interesses imperialistas, não resta outra solução senão sair. A juventude africana vai erguer-se e colocar estes ‘representantes’ no seu devido lugar”, alerta um comunicado divulgado por um grupo de jovens patriotas em Bamako.

O debate sobre o futuro da democracia africana e o papel das instituições continentais está longe de terminar. Enquanto uns apelam à ordem constitucional tradicional, outros exigem uma ruptura completa com modelos políticos herdados do colonialismo, propondo um novo paradigma de governação assente na realidade africana e no espírito de autodeterminação.

Recomendado para você

Conteúdo protegido por MozToday.