
Um episódio insólito envolvendo a Polícia da República de Moçambique (PRM) em Nampula e activistas locais está a gerar reacções nas redes sociais e entre os cidadãos atentos à situação política e social da província. A controvérsia gira em torno da recusa por parte da PRM em autorizar uma manifestação pacífica agendada para o dia 31 de Maio, cuja finalidade seria exigir esclarecimentos sobre a crise de combustíveis.
O pronunciamento oficial da PRM, assinado pelo superintendente Moura Muaçale e datado de 30 de Maio, justifica a recusa com base na “situação actual da Ordem Pública” e nas “sequelas das manifestações violentas pós-eleitorais”, alegando insegurança, saques e aumento da criminalidade. No entanto, o tom e conteúdo do documento foram considerados confusos por activistas, que destacam a ausência de argumentos claros e juridicamente sustentáveis.
O pedido da manifestação foi submetido por um grupo de jovens, representado por Sismo Eduardo Muchaiabande. O documento das autoridades refere que a intenção da marcha era “pressionar a quem de direito de forma a esclarecer sobre a real motivação da crise de combustível”. Mas, num tom irónico e visivelmente indignado, um dos activistas, identificado como Gamito, relatou o contacto insólito da polícia.
“Recebo uma chamada de um número desconhecido, e do outro lado estava o senhor Alexandre da PRM, a pedir que me dirigisse ao Comando. Não se apresentou direito, só queria saber onde eu estava. Depois, em menos de uma hora, o Sismo já tinha um despacho em mãos, mesmo estando o pedido dirigido a outras autoridades e não à PRM”, relatou.
Gamito remata com sarcasmo: “Dessa vez, deram-se ao trabalho de escrever, embora sem qualquer sentido. E afinal, o Sismo não explicou que amanhã temos camisetas da FRELIMO para vestir?”
A crítica aponta para uma suposta instrumentalização das forças de segurança em benefício do partido no poder, num ambiente político ainda tenso após as eleições contestadas de 2024. A decisão da polícia é vista por muitos como um bloqueio ao exercício dos direitos de reunião e manifestação consagrados na Constituição moçambicana.
A marcha, agora inviabilizada, pretendia chamar a atenção para os impactos da escassez de combustível, que tem afectado duramente a economia e o dia-a-dia dos moçambicanos. O desfecho, no entanto, levanta uma questão mais profunda: em que medida está a liberdade de expressão e manifestação a ser respeitada no actual contexto moçambicano?